Em tempos de degenerescência como este em que estamos vivendo, com tanta injustiça, ódio, intolerância, corrupção, polarização, será que não temos coisas mais importantes e serias para nos preocupar do que ficar jogando Puzzle and Dragons com a Skin da Hello Kitty? Ou vendo vídeos de gatinhos e japoneses vestidos de ursinho fazendo receitas fofas no YouTube?

O filme Petz 2 – A vida secreta dos bichos levou e está levando milhões de pessoas ao cinema que querem ver os bichinhos fofinhos, e não podemos deixar de falar do estrondoso sucesso do filme Detetive Pikachu, que só o trailer no Youtube soma mais de 65 milhões de visualizações.

Qual será o motivo da ascensão desenfreada do K-Pop? e por que sempre temos uma nova febre de algum aplicativo que faz avatares fofinhos, ou cada vez mais vemos lojas que vendem produtos fofinhos como a Miniso?

No livro “O poder do fofo”, o escritor Simon May diz que o fofo tomou conta do planeta como uma tempestade e os fenômenos globais Hello Kitty e Pokemon, assim como as obras dos artistas Takashi Murakami e Jeff Koons, Heidi, a gabá vesga e E.T, todos refletem esse poder.

No livro, May questiona se tudo isso é apenas fluffy fluffy ou se existe algo de estranho ou até mesmo ameaçador.

A seguir vamos conhecer algumas hipóteses.

Obviamente, toda essa loucura por coisas fofas parte do desejo de fugir de um mundo ameaçador para um jardim de infância, onde as qualidades infantis despertam sensações deliciosamente protetoras, concebendo contentamento e consolo.

Os elementos fofos incluem comportamentos que parecem indefesos, inofensivos e encantadores, características anatômicas como cabeça gigante, olhos em formato de disco, testa saliente e andar desajeitado.

Em 1943, o Zoólogo austríaco, Konrad Lorenz sugeriu que a nossa resposta a este tipo estimulo tenha evoluído para nos motivar a dar aos nossos descendentes os cuidados e atenção extensivos de que necessitam para prosperar. De acordo com Lorenz, as mesmas pistas visuais podem nos despertar para o cuidado igualmente intenso – ou possivelmente mais intenso – quando as encontramos de forma exagerada e destilada em animais, como pássaros e filhotes, e até mesmo em modelos fictícios, como bonecas e ursinhos de pelúcia.

O lado sombrio

Os psicólogos sociais Gary Sherman e Jonathan Haidt da Universidade da Virgínia chegam ao ponto de considerar a resposta de cortesia como uma “emoção moral” por excelência: um “libertador direto da socialidade humana” que nos estimula a expandir nosso círculo de preocupação altruísta para uma esfera social cada vez mais ampla.

Mas se a fofura fosse apenas sobre o indefeso, inofensivos e encantador, ou se a nossa atração por ela fosse motivada apenas por instintos de proteção, ou pela busca de distrações infantis e tranquilizadoras das ansiedades do mundo de hoje, não seria tão presente nos dias atuais.

Essas qualidades falam apenas do que poderíamos chamar o “doce” dentro de um espectro de fofura. À medida que nos aproximamos do fim (do espectro) “sombrio”, as qualidades doces são distorcidas em algo mais escuro, mais indeterminado e mais ferido.

Um exemplo disso é a serie de obras intitulada “Puppy” de Jeff Koons, que parece ao mesmo tempo poderosa (feita de aço inoxidável) e impotente (oca e sem rosto, boca ou olhos). De fato é uma obra bruta como o Hulk mas ao mesmo tempo, vulnerável – soando familiar e desconhecido, tranquilamente inocente e perigoso, defeituoso e perfeito.

Esse tipo de expressão fofa, assim como muitas outras, nos conforta em um mundo de incertezas – e dá voz a esse mesmo mundo, mas crucialmente de forma fofa.